segunda-feira, 2 de setembro de 2013

ASSOCIAÇÕES RELIGIOSAS MARCAM ESPAÇO NA CULTURA MINEIRA

Com forte presença principalmente no século XVIII, as irmandades, ordens terceiras e confrarias religiosas foram instituições que reuniam leigos, tanto das camadas mais abastadas quanto mais pobres. Estes homens e mulheres se associavam em torno de um santo de devoção, buscando proteção e graças divinas, praticando caridade, e ainda estabelecendo relações sociais.

Além de promover a religiosidade, essas agremiações prestavam assistência a seus associados, particularmente na hora da morte, considerada o ponto central na vida dessas instituições. As irmandades cuidavam para que seus membros tivessem enterros solenes, marcados pela pompa fúnebre (tanto mais requintada quanto mais rico o irmão falecido), que expressavam prestígio social.



Livro de Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora da
Apresentação da Freguesia de Nossa Senhora do Bom Sucesso da
Vila Nova de Rainha, Caeté, 1738.
Acervo Arquivo Público Mineiro

Nas Minas Gerais, do século XVIII, essas organizações se marcaram como importantes pilares de sustentação da fé católica. Com a proibição régia da presença de entrada e fixação das ordens religiosas regulares na Capitania de Minas, as ordens terceiras apareceram ligadas a capelas de confrarias ou à própria igreja paroquial – enquanto no restante do Brasil estas ordens se ligavam a conventos das ordens regulares.

As irmandades, confrarias e ordens terceiras, apesar de certa autonomia adquirida no período colonial, sempre estiveram subordinadas à jurisdição eclesiástica e temporal. Fundada a corporação e eleita sua mesa diretora, esta designava o secretário ou qualquer irmão que ostentasse dotes de bom redator, para redigir o livro de compromisso ou estatuto próprio. Durante grande parte do período colonial, seus compromissos eram enviados a Lisboa para aprovação da Mesa de Consciência e Ordens, criada em 1532. A Mesa fazia um controle mais rígido, fiscalizando as anuidades cobradas, os bens e os livros internos, a ereção e a construção de templos.

Nos primeiros anos de povoamento na Colônia, eram obrigatórias as Irmandades do Santíssimo Sacramento, que simbolizavam a autoridade suprema da corte celeste e arregimentavam as pessoas de maior projeção no arraial. No caso de Minas Gerais, pode-se dizer que a ordens terceiras constituíram uma das bases da estruturação da sociedade, sendo que pessoas de grupos sociais distintos se faziam representar nas diversas associações de irmãos existentes.

A formação das irmandades começa com a instalação das primeiras freguesias e paróquias. A partir de 1720-1740, essas corporações surgem para apoiar e promover a construção de igrejas, polarizando interesses de grupos sociais diferentes. Cada irmandade reunia determinado grupo social ou camada. Existiam irmandades e ordens terceiras de negros, brancos e mestiços, que competiam religiosa, social e esteticamente.

Observando-se os livros de compromisso das irmandades é possível apontar certas características: o preconceito racial, que obriga homens de cor a se reunirem em irmandades próprias; a função assistencial e previdenciária aos seus filiados, chegando a haver empréstimos de dinheiro a juros; e regimes estatutários de disciplina coletiva bastante rígida.


Criada no século XVIII, Irmandade de Nossa Senhora do Rosário
dos Homens Pretos, de Chapada do Norte, matém viva a tradição
da festa de sua padroeira. Na foto, cortejo que procede a cerimônia
conhecida como Lavação da Igreja.

Foram as ordens terceiras religiosas e irmandades de leigos os maiores patrocinadores de quase toda a atividade artística da capitania, dando contribuições inestimáveis na vida intelectual e na cultura. A rivalidade entre duas grandes ordens terceiras, do Carmo e São Francisco, resultou em praticamente metade da obra de Aleijadinho e de Ataíde. Também no terreno da música e educação musical, essas associações deixaram frutos. Em determinado período existia em Minas maior número de músicos ilustres do que na própria corte portuguesa, segundo estudos de Curt Lange, citado por Fritz Teixeira de Salles. As contribuições das irmandades também se refletiram na educação, uma vez que não havendo sistema educacional, as irmandades foram responsáveis pela instrução, por meio de um convívio disciplinado, pelos sermões proferidos nas grandes festas religiosas e no contato direto com os sacerdotes.

Espaço de convívio e socialização, as atividades das irmandades estendiam-se além dos domingos e dias santificados, com a promoção de novenas e bênçãos nas tardes de dias úteis, às quais as corporações exigiam o comparecimento dos irmãos. Ainda no decorrer do século XIX as ordens terceiras continuaram a ser importantes instituições religiosas. No Império, apesar da diminuição de sua representação social, elas mantiveram a essência: a devoção a um santo e a assistência a seus membros.
Invocações prediletas
De acordo com o livro Associações Religiosas no Ciclo do Ouro, as invocações prediletas no interior de Minas são: Nossa Senhora do Carmo, São Francisco, Nossa Senhora da Conceição, Pilar, Santíssimo Sacramento, Arcanjo São Miguel, São Pedro dos Clérigos, Senhor dos Passos, Santana, para os de pele brancos; Nossa Senhora do Amparo, S. Francisco de Paula, São José dos Bem Casados, Pardos do Cordão, para os pardos; e Rosário, São Benedito, Mercês e Santa Efigênia, para os negros.


Código de Direito Canônico de 1917

O Código de Direito Canônico, de 1917, é uma compilação de todas as leis canônicas até aquela data, constituindo um resumo do que a Igreja tem estabelecido como os deveres essenciais dos seus fiéis, tanto individual quanto coletivamente. Cânones referentes às Ordens Terceiras, Irmandades e Confrarias:

Can – 701
§ 1º - Ordem de Precedência:
1 – Ordens Terceiras
2 – Arquiconfrarias
3 – Confrarias
4 – Pias Uniões Primárias
5 – Pias Uniões Outras

Ordens Terceiras
Can – 702
§ 1º - Terceiros Seculares são aqueles que, vivendo no século, debaixo da direção de alguma ordem, e conforme o espírito da mesma, se esforçam por adquirir a perfeição cristã de uma maneira acomodada à vista do século sejam as rezas para elas aprovadas pela Sé Apostólica.
§ 2º - Se a Ordem Terceira Secular se divide em várias associações, cada uma destas, legitimamente constituída, se chama Irmandade de Terceiros.

Confrarias
Can – 707
§ 1º - As associações de fiéis que tenham sido eretas para exercer alguma obra de piedade ou caridade se denominam pias uniões; as quais, se estão constituídas em organismos, chamam-se irmandades.
§ 2º - E as irmandades que tenham sido eretas ainda mais para o incremento do culto público recebem o nome particular de confrarias.

Can – 708
§ 1º - As confrarias só podem ser eretas por decreto formal de ereção; enquanto às pias uniões basta aprovação do Ordinário obtida esta, adquirem, sem obstáculo algum, capacidade para conseguir graças espirituais, sobretudo indulgências.

Arquiconfrarias e Uniões Primárias
Can – 720
§ 1º - As irmandades que gozam de faculdade para agregar a si outras da mesma espécie se chama arquiirmandades ou arquiconfrarias, ou pias uniões, congregações ou sociedades primárias.
Fonte: Associações Religiosas no Ciclo do Ouro


Indicação Bibliográfica

Lançado em 1963 e considerado um dos textos pioneiros e inovadores sobre o estudo das irmandades religiosas, Associações Religiosas no Ciclo do Ouro, de Fritz Teixeira de Salles, teve sua 2ª edição revista e ampliada em 2007. O estudo abriu as perspectivas de pesquisa dessas associações como espaço privilegiado para compreensão da vida social e econômica das cidades por reproduzirem em sua unidade as estruturas básicas da sociedade colonial mineira.


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